Asclepio. Revista de Historia de la Medicina y de la Ciencia 75 (1)
enero-junio 2023, e13
ISSN-L: 0210-4466
https://doi.org/10.3989/asclepio.2023.13

ESTUDIOS / STUDIES

HOSPITAL OPHTÁLMICO INTERNACIONAL: UMA BREVE HISTÓRIA (SÃO PAULO, 1903-1914)

INTERNATIONAL OPHTHALMIC HOSPITAL: A BRIEF HISTORY (SÃO PAULO, 1903-1914)

Soraya Lodola

UFPR - Universidade Federal do Paraná

https://orcid.org/0000-0001-9167-311X

Cristina de Campos

UNICAMP - Universidade Estadual de Campinas e Universidade São Judas Tadeu

https://orcid.org/0000-0001-9379-5057

Ana Nemi

UNIFESP - Universidade Federal de São Paulo

https://orcid.org/0000-0002-8452-2660

RESUMO

Neste artigo, a intenção é historicizar sobre o primeiro hospital de São Paulo dedicado a oftalmologia. O Hospital Ophtálmico Internacional foi fundado por italianos em 1903 em meio ao processo endêmico de tracoma no estado. Objetivamos compreender as circunstâncias históricas e as motivações políticas e econômicas que impulsionaram sua fundação, além de inferir sobre as relações entre as esferas públicas e privadas. Como o hospital foi criado inicialmente para atender imigrantes italianos que vieram trabalhar em São Paulo, articulamos, nesta história, as ações em saúde encetadas no Hospital com o processo de expansão da lavoura cafeeira e a imigração italiana. Em termos documentais, a pesquisa pautou-se em relatórios governamentais, matérias jornalísticas, teses e artigos científicos. A partir da historicidade da instituição, foi possível identificar a atuação da igreja católica na fundação do hospital, compreender os interesses econômicos dos fundadores do hospital ao defenderem a elite cafeeira paulista das denúncias de maus tratos dos seus trabalhadores e inferir sobre as motivações políticas na manutenção de uma instituição que primava atender enfermos de tracoma.

Palavras chave: 
História das práticas e da saúde; História das instituições; Instituições de assistência; Tracoma; São Paulo; Brasil.
ABSTRACT

In this article, the intention is to historicize the first hospital in São Paulo dedicated to ophthalmology. The International Ophthalmic Hospital was founded by Italians in 1903 amid the endemic process of trachoma in the state. We aim to understand the circumstances stories and the political and economic motivations that drove its foundation, in addition to inferring the relations between the public and private spheres. As the hospital was initially created to serve Italian immigrants who came to work in São Paulo, we articulated, in this story, the health actions initiated in the Hospital with the process of expansion of coffee plantations and Italian immigration. In documentary terms, the research was based on government reports, journalistic articles, theses, and scientific articles. From the historicity of the institution, it was possible to identify the role of the Catholic Church in the foundation of the hospital, understand the economic interests of the founders of the hospital by defending the coffee elite of São Paulo from the complaints of mistreatment of its workers and infer on the political motivations in maintaining an institution that was primarily in the care of trachoma patients.

Keywords: 
History of practices and health; History of institutions; Care institutions; Trachoma; São Paulo; Brazil.

Received: 14 julio 2021; Accepted: 23 marzo 2022; Published: 1 junio 2023

Citation / Cómo citar este artículo: Lodola, Soraya; Campos, Cristina de; Nemi, Ana (2023), “Hospital Ophtálmico Internacional: Uma breve história (São Paulo, 1903-1914)”, Asclepio, 75 (1): e13. DOI: https://doi.org/10.3989/asclepio.2023.13

INTRODUÇÃO

 

Quando o Hospital Ophtálmico Internacional de São Paulo foi inaugurado em 1903 na capital paulista, o Brasil prosperava em decorrência das exportações de café, atingindo o topo dos maiores exportadores mundiais dos grãos. O impulsionamento econômico advindo da agricultura cafeeira se desenhou após a saída do mercado internacional de importantes países produtores de café e do ingresso dos Estados Unidos como um grande consumidor do produto brasileiro. As áreas de maior produção neste período concentravam-se em São Paulo, estado com terras abundantes e com matas virgens e férteis, o que criava um ambiente propício à expansão das fazendas cafeeiras (Melo, 2006; Marquese e Tomich, 2009).

O aumento das produções e as demandas crescentes fizeram São Paulo se tornar a província mais próspera do país. Com a Proclamação da República em 1889, o governo federal deu autonomia aos estados para gerir seus próprios recursos, favorecendo São Paulo que se enriquecia com a nova dinâmica econômica. Para impulsionar a economia, o governo paulista melhorou o acesso às linhas de créditos para aquisição de equipamentos e insumos, proporcionou facilidades à expansão de fazendas para regiões ainda inabitadas e intensificou os investimentos em novos ramais ferroviários para escoar mais rapidamente as safras de café até o porto de Santos (Campos, 2010; Silva, 2015).

Apesar dos esforços em estrutura e infraestrutura, impunha-se como tarefa garantir um fluxo de trabalhadores livres após o processo abolicionista, encerrado em 1888, quando foi assinada a Lei Aurea1. O longo processo de libertação resultante de interesses enraizados na escravidão dentro do Brasil e pressões externas, implicou em tentativas de reorganização da mão de obra com o incentivo à imigração cujo primeiro fluxo ocorreu no século XIX, embora mais efetivamente construído em suas décadas finais. Para substituir a mão de obra que seria libertada, o governo paulista decidiu pela imigração, indo ao encontro dos interesses de embranquecimento e europeização da população que também já se desenhavam no debate político da época (Hofbauer, 1999; Oliveira, 2002; Schwarcz, 1993, 2015).

O processo imigratório, que ocorria concomitantemente em outros países do continente americano, provocava rivalidades e disputas entre os países interessados nos trabalhadores europeus. Para despertar o interesse de imigrantes, sobretudo os italianos, o governo de São Paulo fomentou estratégias de atração que incluíam o pagamento das passagens transatlânticas e ferroviárias, alimentação, acomodações e assistência médica até o destino nas fazendas privadas (Baeninger, Péres, Demétrio, 2013; Santos, 2010). Com essa política, o estado elevou repentinamente a sua população chegando a triplicar o número de habitantes em quase três décadas2, acarretando problemas como a falta de moradia, precariedade da estrutura de saneamento e a intensificação de moléstias como a febre amarela, varíola, malária, tuberculose e febre tifoide presentes tanto na capital paulista como em vários municípios do interior e litoral (Ribeiro, 1993; Gonçalves, 2008).

Para amenizar o problema de saúde pública, os municípios contavam com o apoio das comissões sanitárias de administração do governo estadual e com o aparato dos institutos de pesquisa e laboratórios governamentais3 que eram instalados na capital. Essas estruturas próprias visavam apenas auxiliar na profilaxia de enfermidades infectocontagiosas e, em grande parte, em períodos epidêmicos. A assistência médica individual, no entanto, não era oferecida diretamente pelos órgãos públicos, necessitando que o enfermo buscasse atendimento em hospitais filantrópicos, de assistência mútua ou particulares4 (Ribeiro, 1993).

As Santas Casas de Misericórdia5, existentes desde a ocupação portuguesa, eram as principais instituições que os governos estaduais e municipais usavam para sanar a demanda por assistência médica individual (Khoury, 2004; Silva 2010a, 2011; Sanglard e Ferreira, 2018). As instalações da instituição filantrópica em diversos municípios justificam a sua relevância no cenário da assistência médica hospitalar do período. Em 1905, por exemplo, as Santas Casas estavam presentes em 54 municípios paulistas6. Em 1910 já eram 72 unidades7 e, em 1915, 88 hospitais8.

Os governantes auxiliavam as irmandades com repasses mensais para prestarem assistência aos pobres e desvalidos que não possuíam verbas para pagar seus tratamentos (Silva 2010a, 2011; Ferreira et al. 2019)9. Além das Santas Casas, o governo auxiliava hospitais de auxílio mútuo, institutos filantrópicos ou caritativos, policlínicas e maternidades, desde que fossem sem fins lucrativos (Lodola e Campos, 2020). A relação com quase uma centena de hospitais subvencionados pelo governo do estado publicados no Relatório da Secretaria do Interior em 1906, nos auxilia dimensionar o aparato hospitalar presente em São Paulo10.

Dentre as diversas instituições subvencionadas pelo governo estadual paulista, nos despertou a atenção a presença do Hospital Ophtálmico Internacional, o único hospital dessa categoria no estado. Objetivamos nesse artigo historicizar este hospital para compreender as circunstâncias históricas e as motivações políticas e econômicas que impulsionaram sua fundação, além de inferir sobre as relações entre as esferas públicas e privadas presentes na sua atuação. Por ser uma instituição fundada por italianos para atender seus conterrâneos, articulamos no artigo as ações em saúde encetadas no Hospital com o processo de expansão da lavoura cafeeira e a imigração italiana. Em termos documentais, a pesquisa pautou-se em relatórios governamentais, matérias jornalísticas, teses e artigos científicos.

Dividimos o artigo em 3 partes além da introdução. Na parte 1 abordaremos em que contexto sanitário o hospital foi criado, na parte 2 quais as motivações para sua fundação e, na parte 3, discorreremos sobre o funcionamento e manutenção da instituição.

O TRACOMA EM SÃO PAULO

 

Em 1904 o governo estadual enviou para o interior de São Paulo uma equipe médica liderada pelo inspetor sanitário Guilherme Álvaro para diagnosticar a situação de tracoma entre os trabalhadores agrícolas depois de receber denúncias sobre a falta de assistência médica aos enfermos. A conjuntivite granulosa ou tracoma, era uma enfermidade oftálmica altamente contagiosa que pode levar a cegueira se ocorrer constantes reinfecções. Ela atingiu principalmente os habitantes das zonas rurais do estado que viviam em condições precárias de moradia e que trabalhavam em situações climáticas que favoreciam as reinfecções como o sol, o vento e a poeira11.

As queixas da epidemia do tracoma no interior chegaram na capital paulista ainda em fins de 1890, quando médicos e representantes governamentais alertaram nas revistas médicas e na imprensa a gravidade da situação epidemiológica. Esses atores estimavam que 75% dos trabalhadores das fazendas agrícolas da região oeste do estado estavam com tracoma e que a totalidade dos alunos de uma escola pública era composta de tracomatosos (Ribeiro, 1993; Lodola e Campos, 2018). O médico oftalmologista David Ottoni imprimiu suas observações na Revista Brazil Médico ainda em 1898, quando destacou que em sua clínica “afluem doentes granulosos [tracomatosos] em número extraordinário”, onde a “conjuntivite granulosa [tracoma] não está muito longe de merecer cuidado que tem sido dispensado àquelas outras moléstias [febre amarela], tal a abundância de doentes que aqui observamos, muitos dos quais já perdidos”12. A intensa disseminação da enfermidade oftálmica na população rural apontava que havia um sério problema de saúde pública que tinha sido negligenciado pelos órgãos públicos de saúde.

A inserção do tracoma em terras paulistas, de acordo com o Secretário dos Negócios do Interior, departamento responsável pela saúde pública de São Paulo, ocorreu durante o período da intensificação das políticas imigratórias, que introduziu no estado imigrantes italianos adoentados de tracoma. No seu relatório anual, o Secretário relata que o tracoma só foi identificado depois da imigração europeia iniciada em 1887, especialmente com a chegada de italianos, um país que padecia da doença há mais de 40 anos13. As afirmações do Secretário estavam embasadas pela produção médica internacional14, como por exemplo, as pesquisas do médico Ernesto Papargone, realizada na Itália em 1922, que indicava que o país possuía alguns núcleos endêmicos, chegando a atingir um índice de positividade que ultrapassava 50% nas regiões de Palermo e Cagliari entre os anos de 1901 e 190815.

A alta prevalência italiana estava atrelada à disseminação do tracoma por toda a Europa, no norte da África e em boa parte da Ásia, em um processo que remonta as primeiras décadas do século XIX quando ocorreu o retorno do exército de Napoleão à Europa depois de invadirem o Egito, região de grande incidência de tracomatosos. Na virada do século XIX para o XX, os fluxos comerciais e imigratórios fizeram com que a doença se espalhasse pela Europa (Holanda, Escócia, Itália, Espanha, Bélgica, França, Alemanha, Suíça, Irlanda e Inglaterra) e pelas Américas (Bolívia, Cuba, Canadá, Chile, Argentina, Brasil e Estados Unidos) (Luna, 1993; Allen, 2002; Taylor, 2009; Milot, 2010; Bernabeu-Mestre e Galina Sánchez, 2011).

O mapa da disseminação do tracoma no interior do estado de São Paulo, realizado pelo Serviço Sanitário em 1904, deu subsídios para que os órgãos governamentais paulistas implantassem as primeiras medidas contra a doença. Naquele mesmo ano, foi iniciada a vistoria nos portos, e, em 1906, foram implantadas medidas profiláticas e de tratamento com vistorias escolares e instalação de uma rede de postos médicos espalhados um na capital e os demais em 37 municípios do interior do estado. A equipe formada por médicos e auxiliares tinha como atribuição tratar os enfermos durante quinze dias consecutivos com a aplicação de soluções medicamentosas, a queimação dos folículos oculares, além de desenvolver cirurgias e prestar aconselhamentos (Luna, 1993; Telarolli Jr., 1996; Gois, 2020). Esses procedimentos médicos, que eram adotados em vários países, tornavam o tratamento doloroso, longo e de difícil finalização, uma vez que havia dificuldade de deslocamentos dos enfermos que habitavam nas áreas rurais até os postos urbanos de atendimento. Apesar dos entraves, em quase dois anos de funcionamento da campanha profilática e de tratamento (1906-1908), a equipe médica atendeu mais de 104 mil tracomatosos, identificou quase 20 mil alunos com a doença e realizou 2.828.115 curativos16.

Embora houvesse uma intensa estrutura formada, percebemos que as politicas governamentais do período não priorizaram as questões de saúde pública relacionadas ao tracoma pois, mesmo com um elevado índice de enfermos a espera de tratamento, o governo estadual encerrou a campanha em 1908, com a justificativa da falta de recursos para manutenção de uma estrutura que contou com 521 profissionais entre médicos e auxiliares. Com o fechamento dos postos, o governo estadual transferiu para as “casas de caridade”17 a atribuição de realizar os tratamentos dos tracomatosos18.

O encerramento das atividades públicas para tratar os tracomatosos repercutiu na comunidade internacional, que passou a exigir medidas profiláticas e de tratamento para seus conterrâneos com ameaças de interromper o fluxo imigratório (Gois, 2020). Essas pressões desencadearam em uma nova iniciativa em 1911, mas com uma equipe bem menor, composta de 16 médicos e 22 enfermeiros que deveria atender toda a população do estado de São Paulo. Com um grupo diminuto, a segunda campanha conseguiu examinar em 3 anos 48 mil pessoas, 15 mil escolares, tratar 33 mil tracomatosos e realizar mais de 1 milhão de curativos. Como consequências da Primeira Guerra Mundial, a segunda campanha também foi encerrada em 1914 sem que houvesse controle sobre a doença19.

Desde os primeiros indícios de endemia de tracoma, o governo estadual foi pressionado a montar uma estrutura própria e definitiva de hospitais para atender os tracomatosos, em um movimento que já ocorria na Inglaterra, França, Bélgica e Egito (Lodola e Campos, 2020). Essa demanda foi provocada pela superlotação de tracomatosos que buscavam atendimento na Santa Casa da capital, o maior e mais estruturado hospital da época e que possuía uma ala específica para os “Serviço de Moléstia dos Olhos”. Embora o hospital tivesse um espaço designado para atender os tracomatosos, as instalações disponíveis não eram suficientes para atender a alta demanda, como verifica-se em comunicado da chefia do setor de oftalmologia da Santa Casa expedida em 1903:

O hospital da Santa Casa tem as suas duas enfermarias de moléstia dos olhos literalmente cheias, não só todos os leitos estão ocupados, como em colchões no assoalho e pelos corredores vizinhos às enfermarias. É obrigada a Santa Casa a abrigar estes infelizes, que não podem ser tratados em domicilio, vindo a consultar, pois alegam que não tem posses para pagar a hospedagem durante o tempo que têm que se sujeitar-se ao tratamento que é longo20.

A superlotação da Santa Casa era resultado da falta de assistência médica estruturada para doenças oftálmicas no interior do estado, fazendo com que os enfermos e seus acompanhantes viajassem para a capital em busca de tratamento gratuito na instituição filantrópica. A falta de hospitais na capital sensibilizou médicos e políticos que se manifestaram de forma contundente pela criação de novos hospitais públicos para o tratamento do flagelo. O médico Melo Barreto foi uma dessas vozes que teceu duras críticas ao governo do estado. Em uma série de notas publicadas na imprensa em 1903, destacou a imperativa necessidade de hospitais para o tracoma, tomando como exemplo o que havia sido realizado pela cidade de Nova York (EUA). A nota, publicada no “Commercio de S. Paulo”, enfatizava as ações bem-sucedidas dos estadunidenses:

A nomeação de inspetores e a criação de hospitais onde esses doentes [tracomatosos] são tratados tem um grande alcance [nos Estados Unidos] e os resultados obtidos são largamente compensadores e se assim continuar não estará longe o dia, em que tão grave moléstia, que tantos casos de cegueira tem produzido, poderá desaparecer, aliviando o governo [americano] a sustentar tão grande numero de inválidos21.

As pressões da comunidade médica e as exigências parlamentares fizeram com que o governo estadual paulista, em 1912, designasse um terreno para a construção do primeiro hospital público oftalmológico para assistência médica individual. Notícia veiculada no jornal “Correio Paulistano” informou que em 26 de abril foi realizado o lançamento da pedra fundamental do hospital, que reuniu várias autoridades públicas. Segundo o jornal, houve inclusive uma manifestação do engenheiro responsável que descreveu a edificação, ressaltando sua grandiosidade e capacidade de atendimento. Segundo a nota, o hospital foi planejado com capacidade para 700 leitos, distribuídos em quatro pavilhões e que atenderia objetivos clínicos e administrativos22.

A obra, no entanto, acabou não se efetivando. Em maio do mesmo ano, com a troca dos gestores do governo, a edificação do hospital não foi priorizada, indicando que as medidas de combate ao tracoma não estavam na agenda de governo23. Por outro lado, observou-se que o governo italiano, preocupado com a recepção de seus conterrâneos em São Paulo, começou a se movimentar no sentido de criar uma instituição voltada para assistência aos colonos italianos, como será observado na próxima seção.

“SECRETARIATO DEL COLONI ITALIANI” E AS INTENÇÕES DA OFERTA DE UM SERVIÇO PARA OS TRACOMATOSOS

 

A história do Hospital Ophtálmico Internacional começa em 1901, quando o padre Guglielmo Paolini foi designado pela “L’ Opera dei congressi” a instalar um serviço de proteção ao imigrante italiano em São Paulo. A “L’ Opera dei congressi” foi uma organização italiana criada em 1875 para discutir e defender os direitos e interesses religiosos italianos através de um programa que objetivava a intervenção da igreja católica na educação, nas obras piedosas e na luta contra a imoralidade e o socialismo (Sani, 2017; Pellegrini e Perissinotto, 2010). Uma das alas do Ópera ficou encarregada de cuidar da emigração com a finalidade de amparar os italianos recém desembarcados em terras estranhas à língua e à cultura. A preocupação era proteger a fé católica dos italianos que poderia sofrer com propagandas das “seitas protestantes e do socialismo”, e apoiar seus conterrâneos com questões burocráticas e econômicas (Pellegrini e Perissinotto, 2010).

Um dos escritórios do Ópera era o “l`Ufficio Regionale Veneto”, que ficou responsável pela abertura do serviço de apoio ao migrante em São Paulo. O Padre Guglielmo Paolini foi o escolhido para implantar o escritório em terras paulistas, e teria a incumbência de: a) criar igrejas nos núcleos italianos que deveriam ser coordenadas por padres italianos e que realizassem missas e confissões na língua materna, e b) criar um conjunto de serviço para amparar o imigrante com questões burocráticas, econômicas e assistenciais. De acordo com Sani (2017), a proposta da criação de igrejas administradas por italianos em solo brasileiro sofreu resistências do arcebispo monsenhor Duarte Leopoldo Silva que não admitia a interferência de italianos nas paróquias. Com tais relutâncias, o padre Paolini voltou suas atenções ao segundo objetivo e criou o “Secretariato del coloni italiani” que foi responsável, dentre outras atividades, pelos primeiros serviços oftalmológicos oferecidos aos italianos, e que mais tarde tornar-se-ia o Hospital Ophtálmico.

Para a criação e o funcionamento do Secretariado, entretanto, o padre necessitava de verbas e do acesso aos imigrantes que estavam alocados dentro das propriedades privadas rurais. Para suprir tais problemáticas, Paolini buscou estratégias que vinculavam os interesses dos fazendeiros com as necessidades dos trabalhadores. Os primeiros passos para a efetivação do Secretariado foram dados no início de 1901 quando Guglielmo Paolini realizou uma peregrinação de cinco meses com visitas em mais de 70 fazendas de café do interior paulista para verificar a situação dos imigrantes italianos que foram denunciados por maus tratos na imprensa internacional e em relatórios governamentais estrangeiros24. Em sua viagem, o padre escutou os relatos dos fazendeiros e de alguns trabalhadores da região de Ribeirão Preto, um local de grande produtividade cafeeira no período.

No seu retorno, o padre apresentou à Secretaria da Agricultura, órgão responsável pelos serviços de imigração, um detalhado relatório que expunha as situações encontradas. A partir da visita do missionário, o jornal “Correio Paulistano”25 publicou uma nota no dia 23 fevereiro de 1902 que tinha como fonte o relatório apresentado pelo padre. Essa nota enfatizou que o problema dos colonos italianos estava na adaptação desses imigrantes que aportavam no país, e não na tensão presente na relação conflituosa entre os trabalhadores e os fazendeiros. De acordo com o padre,

As saudades da pátria, alguns incômodos de saúde devidos á mudança do clima, a necessidade de adaptarem-se a novos usos e trabalhos, fazem com que os colonos recém-chegados manifestem certo descontentamento. É certo, porém, que estes colonos constituídos em famílias, dispondo de muitas pessoas aptas para o trabalho, com um chefe morigerado e ativo encontra-se em condições lisonjeiras26.

Para defender os fazendeiros das acusações de maus tratos, o padre Paolini tratou de desmentir as notas publicadas nos jornais e as observações dos enviados de outros países que foram averiguar a situação dos colonos europeus. Segundo o religioso, as notas veiculadas afirmando que faltava o necessário para a subsistências das famílias era uma inverdade. E prossegue assegurando que uma família esforçada conseguia, em um ano, honrar a dívida com o fazendeiro e, os trabalhadores com família numerosa estabelecidas a mais de três anos, conseguiam realizar uma boa poupança27. Em sua visão, o problema residia em famílias cujos chefes eram “insolentes ou viciosos” perseguidos por doenças28.

Sobre as declarações de falta de pagamentos por parte dos fazendeiros, o padre deu a seguinte declaração:

A crise existe e é forte, mas isso somente em duas fazendas. Em todas as que visitei achei que o dono simpatizava com todo o esforço para poder pagar pontualmente os colonos e, se as vezes o pagamento demorava, não era por maldade ou por desejo ruim, mas somente pela inexorável necessidade29.

O jornal paulista que publicou as notas com o relato do padre era um veículo de imprensa ligado ao partido que representava a oligarquia agrária paulista, o Partido Republicano Paulista (PRP) que dominou a política do estado durante toda a Primeira República (1889-1930) e que possuía interesses em manter uma imagem positiva do processo imigratório. Em suas páginas, o jornal Correio Paulistano publicou que o religioso raras vezes ouviu relatos de maus tratos e que seu testemunho era importante para desmentir aqueles que procuravam sistematicamente “fazer acreditar que os colonos aqui se acham submetidos a um regime que lembra o da escravidão”30. As visitas realizadas nas fazendas e a publicação na imprensa do Relatório apresentado ao representante governamental eram parte de uma estratégia que visava legitimar a proposta de organização do Secretariado que ocorreria meses depois, como poderemos verificar.

Três meses após o Relatório ser publicado, o padre Paolini apresentou nas páginas do mesmo impresso o “Secretariado da Colonia Italiana” denominando-o como “obra meritória”31. A “obra” de Paolini tinha como proposta auxiliar os recém-chegados com informações sobre hospedagens, instruções sobre o funcionamento de casas bancárias, operações de câmbio, horários de chegadas e partidas de transportes, preços de gêneros diversos de uso cotidiano, instruções sobre documentos diversos e envio de correspondência.

Na mesma nota publicada no jornal, o padre aproveitou para solicitar aos fazendeiros verbas adicionais para um serviço complementar ao Secretariado e que, conforme alegou o missionário, traria vantagens para os colonos e fazendeiros32. Os auxílios financeiros seriam necessários pois o serviço complementar para atendimento de mais de 200 mil famílias envolvia grandes despesas pois era uma caridade pública essencial. De acordo com o padre,

Estamos certos de que todos, mas particularmente os srs. Fazendeiros, virão ajudar-nos bem conhecida é a generosidade dos paulistas. E, assim, responderá a todo aquele que sistematicamente procura, baseado em fatos isolados, fazer acreditar que os colonos aqui se acham submetidos a um regime que lembra o da escravidão, e que pretende comparar os fazendeiros ao senhor da idade média33

Em agosto de 1902, o padre imprimiu a primeira edição do jornal “L´amico del lavatori”, uma publicação mensal escrita em italiano e produzida pelo “Secretariato del Coloni Italiani”. A sua primeira página indicava que o jornal tinha o aval da oligarquia, com os seguintes dizeres: “Importante: pede-se aos senhores fazendeiros de distribuir os exemplares aos colonos”34.

A primeira edição tinha 4 páginas cujos temas ali publicados discorriam sobre temas diversos como religião, economia, notícias internacionais (especialmente da Itália) e uma nota com os serviços gratuitos ofertados pelo Secretariado aos colonos. Na página 2 da edição foi escrito um texto reforçando o apoio que os oligarcas tinham para as ações encetadas por Paolini. O texto era uma nota de agradecimento aos Junqueiras, opulenta família da cidade de Ribeirão Preto, uma das principais zonas produtoras de café do interior paulista. A família Junqueira havia possibilitado que Paolini visitasse outras fazendas da região para pedir apoio, além de terem financiado o seu “Secretariado”. Escreveu Paolini:

É-me querido professar publicamente aqui muito obrigado aos senhores fazendeiros, porque foi somente mediante o seu apoio que pude realizar em parte o que me parecia um sonho.

Hoje o Secretariado da Colônia Italiana é uma realidade, já está aberto, já funciona e, a partir do seu movimento será bem entendido como era necessário.

Oh! Estamos certos, os fazendeiros em grande maioria amam seus colonos. E como eu poderia afirmar algo diferente se eles, com sua gentileza, com seu compromisso contribuíram e contribuem para apoiar esta Secretaria?

Desconhecido de todos, foi o suficiente para me apresentar em suas casas como um obscuro iniciador de um trabalho útil para a colônia, para que eu pudesse abrir as portas de suas fazendas e colocar-se a minha disposição para o que eu precisava. O que quer mais?35

Em 12 de outubro do mesmo ano, padre Paolini anunciou mais uma iniciativa, dessa vez, um asilo para hospedagem de imigrantes na cidade de São Paulo. Situado na Avenida Paulista, no número 224, o asilo era outra ação realizada em parceria com fazendeiros36. Em 1903 o asilo mudou para outro endereço, em uma chácara que era de propriedade de Paolini, na Rua Pires da Mota. A novidade do asilo foi a oferta de tratamentos para colonos italianos acometidos pelo tracoma. O jornal “L´amico del Lavatori” noticiou que os colonos recebiam tratamento gratuito, bem como a hospedagem e alimentação no asilo.

Paolini explicou que a abertura do asilo e do serviço de oftalmologia veio em decorrência das visitas realizadas nas fazendas em 1901, conforme apontamos anteriormente. Na visita, o padre explicou que constatou número significativo de doentes com tracoma que os debilitavam e não permitiam o bom desempenho de suas atividades nas fazendas. Um relato sobre a situação pode ser conferido em nota publicada em outro jornal da cidade de Juiz de Fora, “O Pharol”:

Quem percorre Ribeirão Preto, S. Carlos, Jaú e seus municípios, entre outros fica impressionado com a enorme quantidade de oftálmicos que encontra, sendo gerais as queixas dos fazendeiros acerca do número crescente de colonos que se vão tornando incapazes para os trabalhos agrícolas37.

O novo serviço trazia vantagens, na percepção do padre, tanto aos doentes como aos fazendeiros. Para convencer sobre a qualidade dos serviços prestados, Paolini frisou que os tratamentos estariam a cargo do médico Francesco Pignatari38, reconhecido especialista italiano que havia desenvolvido tratamentos menos doloridos e com uma cura mais eficiente. O método inovador permitiria um retorno rápido do trabalhador para sua labuta na fazenda, atendendo assim tanto ao colono como ao fazendeiro39.

Com a abertura do asilo e a intensa procura de tracomatosos por atendimentos, Paolini e o médico Pignatari decidiram transformar o asilo no “Hospital Ophtálmico Internacional”. Assim, em 1903, Paolini protocolou na prefeitura da cidade de São Paulo o pedido da construção de um hospital, no mesmo endereço em que já funcionava o seu asilo40.

HOSPITAL OPHTÁLMICO INTERNACIONAL

 

A nota sobre a criação do hospital foi publicada no periódico “O Pharol”, de Minas Gerais na edição de julho de 1903. Destacou-se que o médico responsável pela instituição, Francesco Pignatari, enfatizou a necessidade de tal instituição visto ser o tracoma um mal de longa data que afligia os colonos. O jornal anunciou que durante a obra seria instalada uma “ambulância oftálmica” para os doentes e que os enfermos seriam atendidos pelo próprio Pignatari41.

A iniciativa de criar o hospital muito se assemelhou as experiências de hospitais especializados europeus que atendiam grande número de pacientes com tracoma. À guisa de exemplo, destacamos a Inglaterra42 que implantou uma rede especializada em doenças oftálmicas para atender adequadamente os tracomatosos, abundantes no início do século XIX naquele país. Entre 1808 e 1889, foram instaladas mais de cinquenta hospitais direcionados à oftalmologia somente na Inglaterra. No final do século havia hospitais especializados em tracoma em várias partes da Europa, como na Hungria e na França que fundou a Clinique Nationale junto ao Hospice de Quinze-Vingts na década de 1880 (Al-Rifai, 1988; Bruce, 2005; Taylor, 2009).

Em São Paulo, o primeiro pavilhão do hospital de especialidades oftalmológicas foi inaugurado em novembro de 1903. Poucos meses depois, a estrutura era composta de dois prédios, cuja capacidade era de atender trezentos e catorze pessoas43.

A planta aprovada para a construção indica que o hospital foi um espaço de assistência médica, e que hospedou os enfermos e seus familiares que precisavam ficar na capital até o fim do tratamento que durava 15 dias. Observa-se na planta aprovada pela Prefeitura de São Paulo que no primeiro pavilhão estava alocada a parte administrativa, o departamento de serviços gerais, o ambulatório, a farmacia, a cozinha, os banheiros e o quarto escuro. O segundo prédio teve seu espaço destinado para os alojamentos tantos dos enfermos quanto dos acompanhantes e, na sua composição, havia quartos, sala das camas, depósito e banheiros44.

A manutenção do hospital era feita a partir das consultas particulares, donativos, subvenção do governo e por “pensionistas” (pessoas que contribuíam mensalmente para o recebimento da assistência). Em nota publicada no jornal “O Commercio de São Paulo” é detalhado como era essa contribuição mensal: “Todos os doentes são os próprios donos do Hospital, pois fazem parte de uma cooperativa que, mediante o pagamento de 5$000 anuais, lhes dá o direito de internações no Hospital, em caso da enfermidade, e ali permanecer até o completo restabelecimento”45.

As verbas governamentais eram repassadas tanto pelo estado quanto pelo município e foram sofrendo aumentos gradativos independentemente do funcionamento das campanhas governamentais. Em um dos debates que ocorreu no âmbito da Assembleia Legislativa de São Paulo para discussão sobre o orçamento para o ano de 1910, o congressista Francisco de Paula Abreu Sodré, que era médico, apresentou emenda para aumentar o auxilio financeiro repassado ao hospital. Nas discussões, o deputado frisou que não existia no estado um serviço público para o enfrentamento do tracoma e o hospital era o único estabelecimento capaz de atender a essa demanda46. Entre os anos de 1904 e 1914 as verbas para o hospital sofreram reajustes 4 vezes, passando de 3:000$ em 1904 para 40:000$ a partir de 1910 (Lodola e Campos, 2020).

Nos dois primeiros anos de funcionamento, o hospital publicou na imprensa diária o balanço dos atendimentos prestados e como foi composta a sua receita. Apesar dos atendimentos gratuitos oferecidos pelo Hospital, observamos que a maior parte das suas receitas advinham de pagamentos dos tratamentos oferecidos aos colonos e pelos pensionistas. No segundo ano de funcionamento, por exemplo, foram recebidas 33:404$ de contribuição dos colonos, 23:301$ de pensionistas e 8:000$ de subvenções governamentais. Como não possuímos dados das receitas do hospital posteriores a 1905, podemos supor que, a partir de 1910 quando o governo começou a repassar 40:000$ ao Hospital, as receitas recebidas pelos atendimentos particulares em relação às gratuidades teriam se equilibrado.

Os enfermos que ficavam internados eram quase todos do interior do estado, e os que recebiam atendimentos na clínica eram, em sua maioria, residentes na capital. No consultório foram curados no primeiro ano 890 pacientes. Com base nas trocas diárias de curativos por duas semanas, calculou-se cerca de 19.800 consultas47. No ano seguinte, com maior procura, calculou-se mais de 37 mil consultas48.

Ao todo foram internados no primeiro ano 583 enfermos sendo o número de europeus assistidos de 534 (entre italianos, portugueses, espanhóis e outros) e os brasileiros apenas 22 pacientes. No segundo ano foram 1047 indivíduos (801 italianos, 107 brasileiros, 55 portugueses, 45 espanhóis e 15 de nacionalidades diversas). Em decorrência da exposição maior aos fatores climáticos que irritavam os olhos e favoreciam a inflamação, os homens eram os mais afetados e isso repercutia sobre o número de atendimentos hospitalares. Em 1903 procuraram atendimento 286 homens contra 159 mulheres e, em 1904, 729 homens e 318 mulheres. As escolas, mesmo sendo um foco importante de transmissão da conjuntivite, não impactaram de forma profunda o número de atendimentos hospitalares, sendo que em 1903 foram 139 crianças atendidas e em 1904, 291 crianças. Em 1906, mesmo com a implantação dos Postos de Tracoma, o número de pacientes teve expressiva alta. Quase o triplo de atendimentos foram registrados em relação ao ano anterior cujo número ficou na casa dos 2.934 atendimentos, onde 2.390 eram tracomatosos e os demais 544 apresentaram outras doenças oftálmicas49.

Em 1914, quando o governo estadual fechou a segunda campanha contra o tracoma em decorrência dos abalos financeiros provocados pela Primeira Guerra Mundial, o Hospital Ophtálmico Internacional acabou sendo vendido para Roberto Lucci, que transformou a instituição no Sanatório do Morro Vermelho. Não foram encontrados registros sobre as motivações da venda, mas pode-se inferir que Paolini e Pignatari teriam recebido informações indicando que sofreriam problemas financeiros em decorrência da exclusão ou diminuição das verbas governamentais às instituições de assistência provocadas pela baixa arrecadação das exportações, efeito direto da Primeira Guerra. Esse cenário se concretizou no plano orçamentário para o ano de 1915 com o corte de 75% das verbas governamentais para o hospital, passando de 40:000$ em 1914 para 10:000$ em 191550.

Com a nova direção, o hospital abriu outras frentes de serviços médicos prestados, como o Instituto Electro-Kinesitherapico, voltado para consultas gerais. Sobre o tracoma, em nota publicada no jornal Correio Paulistano, a nova diretoria do hospital informou que entre fevereiro e maio de 1914, havia sido realizadas 2.197 consultas na área de oftalmologia, sendo um número elevado de tracomatosos crase à procura de auxílio51. Em 1919 as atividades do hospital foram encerradas. No terreno em que a instituição funcionava foi instalado em 1924 o Instituto de Veterinária, criado pelo governo estadual de São Paulo que futuramente integraria a Universidade de São Paulo em 1934. Não foram encontrados indícios que permitiram discutir sobre o fechamento do Hospital do Morro Vermelho e nem os motivos que levaram a transição de um empreendimento particular para a implantação de uma instituição pública voltada a atender serviços educacionais.

O estado de São Paulo ainda sofreu por décadas os percalços do tracoma. Expedito Luna (1993), que estudou a fundo a ocorrência do tracoma em São Paulo até o final da década de 1990, enfatiza que em algumas regiões do estado os focos de tracoma se fizeram presentes durante todo o século XX.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

O Hospital Ophtálmico Internacional foi fundado por iniciativa da igreja católica, através de um serviço especial que objetivava amparar os seus conterrâneos italianos que migravam para países com línguas e/ou religiões e/ou ideologias diferentes das que eram por ela pregadas. A maior preocupação era manter a fé católica e, para tanto, a aproximação da ordem nas atividades de apoio durante a moradia dos imigrantes em terras estrangeiras se fazia necessária.

Assim, em 1901 o padre Paolini criou um conjunto de serviços e atividades para dar suporte aos italianos que chegavam em terras paulistas em busca de trabalho nas fazendas de café. Além do “Secretariado del Coloni Italiani”, que auxiliava com serviços burocráticos e de informações, o missionário fundou o jornal “L´amico del lavatori” e o Asylo do Padre Paolini, que recebia enfermos das zonas rurais para serem tratados nos hospitais da capital. Com a intensa endemia de tracoma no estado e a falta de estrutura pública para atender os enfermos, em 1903, o Asilo se transformou no Hospital Ophtálmico Internacional.

As motivações para a criação e manutenção do hospital, no entanto, extrapolaram as necessidades de apoio assistencial aos imigrantes pela igreja e avançaram sobre os interesses econômicos e políticos. Durante os discursos proferidos pelo missionário ficam evidentes as vantagens dos serviços para fazendeiros, responsáveis pela situação econômica favorável ao estado. Entre os argumentos estão as propagandas favoráveis à imigração com discursos de negação sobre os maus tratos aos seus trabalhadores e as vantagens do atendimento aos tracomatosos, que poderiam retornar aos seus serviços na lavoura rapidamente depois de receberem tratamento pelo médico especialista Francisco Pignatari.

Para o governo estadual, manter as atividades do Hospital Ophtalmico ativas através de repasses financeiros, aliviaria a pressão sofrida para a implantação de um hospital público, além de sanar a sobrecarga das Santas Casas que não tinham estruturas físicas para suportar o número de enfermos a procura de assistência. Trata-se, assim, de um Hospital cuja história tipifica a articulação entre interesses privados e subvenções públicas para o atendimento à saúde de trabalhadores imigrantes que, esperava-se, fossem braços para o crescimento da lavoura paulista

NOTAS

 
1

O processo de abolição da escravidão ocorreu de forma lenta e gradual, a fim de não impactar negativamente os grandes produtores rurais, cuja produção dependia quase que exclusivamente da força de trabalho escravizada. A abolição ocorreu somente no ano de 1888, quando o Estado brasileiro havia assegurado a entrada de trabalhadores imigrantes para a substituição do trabalhador escravizado (Schwarcz e Starling, 2015).

2

Em 1872 a população de São Paulo era de 837.354 habitantes, em 1900, passou para 2.282.279 (Ribeiro, 1993).

3

O controle do estado sanitário e de algumas enfermidades infectocontagiosas era realizado pelo Serviço Sanitário, que integrava o governo estadual de São Paulo e era de sua responsabilidade a inspeção e o controle sanitário dentro de seu território, além da elaboração da legislação sanitária e de uma rede de instituições de apoio para suas atividades como o Instituto Bacteriológico, o Laboratório de Análises Clínicas, Instituto Vacinogênico e o Desinfectório Central (Ribeiro, 1993).

4

Os únicos hospitais públicos do período eram o Hospital de Alienados, destinado aos doentes mentais e o Hospital de Isolamento que objetivada afastar da sociedade enfermos de varíola e febre amarela (Ribeiro, 1993).

5

As Santas Casas eram instituições filantrópicas, ancoradas nos princípios cristãos da igreja católica e que primavam pela assistência aos pobres e desvalidos. Para conhecer mais sobre o tema, ver Sanglard e Ferreira (2019), Khoury (2004) e Silva (2010a, 2011). A definição das ações públicas de sociedades civis sem fins lucrativos, definida pela República na Lei 173 de 1893, permitiu o enraizamento da experiência das misericórdias como instituições filantrópicas (Nemi, 2020).

6

São Paulo (Estado). Lei nº 790, de 17 de novembro de 1904. Orça a receita e despesa do Estado para o exercício de 1905. Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo, São Paulo, 1904.

7

São Paulo (Estado). Lei nº 1.197, de 29 de dezembro de 1909. Orça a receita e despesa do Estado para o exercício de 1910. Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo, São Paulo, 1909.

8

São Paulo (Estado). Lei nº 1.463, de 30 de dezembro de 1914. Orça a receita e despesa do Estado para o exercício de 1915. Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo, São Paulo, 1914.

9

Os repasses financeiros governamentais para as Santas Casas são observados tanto em São Paulo com as pesquisas de Silva (2010a, 2011) quanto em outros estados da federação conforme pesquisas publicadas em Ferreira et al. (2019).

10

São Paulo (Estado). Relatório da Secretaria do Interior, anno de 1906. São Paulo: Typographia do Estado de S. Paulo, 1907.

11

Alvaro, Guilherme (1904), “Profilaxia e Tratamento das ophtalmias do oeste de São Paulo”, Revista Médica de S. Paulo, VII (24), pp. 579-582.

12

Ottoni, David (1898), “Clinica Ophtalmologica - Conjunctivite granulosa”, Brazil - Medico, XII (41), pp. 362-365.

13

São Paulo (Estado). Relatório da Secretaria do Interior, annos de 1907 e 1908. São Paulo: Duprat & Comp., 1908b.

14

Sobre a circulação do conhecimento internacional no Brasil, consultar (Ferreira, 1999; Silva, 2010b).

15

Paparcone, Ernerto (1922), Il Tracoma e sue complicazioni, Milano, Soceitá Editrice Libraria.

16

São Paulo (Estado). Relatório da Secretaria do Interior, annos de 1907 e 1908. São Paulo: Duprat & Comp., 1908.

17

Era comum encontrar a denominação “Casas de Caridade” nos relatórios governamentais para designar as instituições de assistência, sejam elas particulares e filantrópicas ou de auxílio mútuo.

18

São Paulo (Estado). Relatório da Secretaria do Interior de 1908-1909. Casa Garraux, São Paulo, 1912.

19

São Paulo (Estado). Relatório do Serviço Sanitário do Estado de São Paulo, annos de 1913, 1914 e 1915. São Paulo: Typographia do Diário Official, 1917.

20

Mattoso, Eusebio de Queiroz. O Trachoma. O Estado de S. Paulo, 21 ago de 1903, p. 2.

21

Barreto, Melo. O Trachoma. O Commercio de S. Paulo, 2 jan 1905, p. 1.

22

O Hospital de Tracomatosos. Correio Paulistano, 27 abr 1912, p. 4.

23

Expedito Luna (1993) estudou as atuações governamentais paulista até a década de 1990, e constatou que a endemia de tracoma ainda permanecia ativa em algumas regiões do estado.

24

Sobre as queixas e denúncias de maus tratos, ler Stolcke, 1986; Trento, 1989 e Rossi, Adolpho (1902). Bollettino Dell´Emigrazione. Ministero Degli Affari Esteri. Roma. Tipografia Nazionale Di G. Bertero F. C.

25

O jornal “Correio Paulistano” foi um jornal diário do Partido Republicano que circulou entre os anos de 1854 a 1963.

26

Um testemunho insuspeito. Correio Paulistano, 23 fev 1902, p. 2.

27

Algumas denuncias afirmavam que os colonos ficavam vinculados financeiramente aos fazendeiros e que os esforços do trabalho na lavoura não eram suficientes para arcar com as obrigações, levando-os a trabalhar em situação análoga à escravidão. Sobre as queixas e denuncias de maus tratos, ler Stolcke, 1986; Trento, 1989 e Rossi, Adolpho (1902). Bollettino Dell´Emigrazione. Ministero Degli Affari Esteri. Roma. Tipografia Nazionale Di G. Bertero F. C.

28

Um testemunho insuspeito. Correio Paulistano, 23 fev 1902, p. 2.

29

Um testemunho insuspeito. Correio Paulistano, 23 fev 1902, p. 2.

30

Um testemunho insuspeito. Correio Paulistano, 23 fev 1902, p. 2.

31

Em favor dos imigrantes. Correio Paulistano, 03 março 1902, p. 1.

32

Em favor dos imigrantes. Correio Paulistano, 03 março 1902, p. 1.

33

Em favor dos imigrantes. Correio Paulistano, 03 março 1902, p. 1.

34

Paolini, Guglielmo. “Gratissimo!” L´amico del Lavatori. 1(1), São Paulo, 25 agosto de 1902, p. 2.

35

Paolini, Guglielmo. “Gratissimo!” L´amico del Lavatori. I (1), São Paulo, 25 agosto de 1902, p. 2.

36

Asylo e Secretariado dos Colonos Italianos. O Commercio de São Paulo, 13 outubro de 1902, p. 3.

37

Notas, O Pharol, Juiz de Fóra, 29 julho de 1903, p. 1.

38

Francesco Pignatari era italiano e desembarcou na cidade do Rio de janeiro durante a década de 1890. Anos depois, mudou-se para a cidade de São Paulo, onde estabeleceu-se em uma clínica particular voltada para o tratamento de moléstias oculares, transferindo essas atividades posteriormente para o hospital. (Il commercio di San Paolo. Malattie degli occhi. O Commercio de São Paulo, 23 jun 1897, p. 2).

39

Paolini, Guilherme., “Miei cari coloni”. L´amico del lavatori, 1(1), S. Paulo, 01 mar 1903, p. 1.

40

Diretoria de obras e viação. Série Obras Particulares. Arquivo Histórico Municipal - Acervo Permanente. Fundo PMSP, Grupo. Ano 1903 Caixa: OP10.

41

Notas, O Pharol, Juiz de Fóra, 29 julho de 1903, p. 1.

42

Constatou-se que na Inglaterra o tracoma estimulou na criação de um campo dentro da medicina - a oftalmologia. No início do século XIX, soldados retornaram ao país depois de batalha travada no Egito trazendo consigo o tracoma. Com essa ocorrência, a doença alastrou-se pela população civil, o que demandou atenção especial da classe médica, fomentando o campo da oftalmologia (Al-Rifai, 1988; Bruce, 2005; Taylor, 2009).

43

Hospital Ophtalmico, O Commercio de São Paulo, 18 março de 1904, p. 2.

44

Diretoria de obras e viação. Série Obras Particulares. Arquivo Histórico Municipal - Acervo Permanente. Fundo PMSP, Grupo. Ano 1903 Caixa: OP10.

45

Hospital Ophtalmico, O Commercio de São Paulo, 18 março de 1904, p. 2.

46

Câmara. Correio Paulistano, p. 2, 07 dez 1909.

47

Publicações - Relatório. Correio Paulistano, 11 julho de 1904, p. 1.

48

Notas e informações, O Estado de S. Paulo, 29 jan 1907, p. 1.

49

Notas e informações, O Estado de S. Paulo, 29 jan 1907, p. 1.

50

São Paulo (Estado) Lei No. 1.463 de 30 de dezembro de 1914. Orça a receita e despesa do Estado para o exercício de 1915, 1914.

51

Sanatorio do Morro Vermelho. Correio Paulistano, 15 junho 1914, p. 1.

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